quarta-feira, 1 de julho de 2009

AS NAÇÕES MAROONS DO SURINAME

Ndyuka ou Okanisi
O Suriname possui seis nações de maroons (quilombolas): Ndyuka ou Okanisi, Saamaka, Pamaka, Matawai, Aluku ou Boni e Kwiinti.
Todas as nações quilombolas partilham uma história de uma repressão brutal aos seus antepassados que foram seqüestrados de várias partes da África para trabalhar como escravizados nas plantações de açúcar, café e algodão no Suriname. Os antepassados recusaram o jugo da escravidão e fugiram para a floresta tropical sul-americana e travaram uma guerra de guerrilha prolongada e vitoriosa aos seus antigos opressores. No decorrer do século XVIII, os colonos holandeses foram forçados a assinar tratados de paz com os grupos Ndyuka (1760), o Saamaka (1762), o Matawai (1767) e os Aluku (1860). Outros grupos Maroon conseguiram também a sua liberdade.
A história das seis nações e sua resistência é bem diferente dos estudos dos quilombos no Brasil onde encontramos uma farta documentação de mocambos e quilombos destruídos praticamente em todo o território nacional, sendo o clássico mais conhecido e ponto de afirmação étnica de luta, os Palmares com Zumbi e seus quilombolas, o qual ainda não foi profundamente estudado apesar de existirem livros, filmes, trabalhos arqueológicos e um memorial.
Há um trabalho incipiente de milhares de quilombos existentes atualmente em território brasileiro com diferentes históricos: fugas de escravos, ex-senzalas, terras doadas ou compradas pós-abolição, posseiros, que leva a conceituações distintas, mas, nenhum deles deve ser comparado às nações maroons do Suriname.
As seis nações maroons tiveram o êxito que os Palmarinos não conseguiram. É uma história viva de lutas por liberdade, terra e africanidade iniciadas em 1670, há mais de 300 anos. É o grande patrimônio material e imaterial da resistência dos africanos na América – Africana, e deve ser fator primordial de apoio dos pan-africanistas em todo o planeta.
No vídeo abaixo retrata a nação Djuka na antiga Guiana Holandesa em 1933. As imagens falam mais altas que as palavras racistas do locutor:
DUTCH GUIANA - LAND OF THE DJUKA 1933

AS LÍNGUAS DOS MARRONS DO SURINAME
Um dos fatores mais lindos da resistência dos escravizados foi à manutenção da língua dos ancestrais e o mais surpreendente é o fato de que sistemas de escritas Africanos sobreviveram aos horrores da escravidão
A LINGUA DJUKA

Nação Igbo e Nação Ndjuka

A nação Ndjuka possui uma escrita própria baseada na língua da nação igbo, que contem 56 letras e foi criada por Afáka Atumisi em 1910 e que continua a ser utilizado no século 21 e 10% dos Ndjuka estão alfabetizados nesta escrita.
É de vital importância o histórico da formação dessa língua. Conta-se que 1908, Afáka Atumisi sonhou com um espírito que lhe disse que era o momento de ensinar aos Ndyuka uma forma de escrever. O espírito prometeu ensinar-lhe um ou dois sinais a cada noite quando o visitasse. E assim aconteceu. Afáka que não sabiam ler e nem escrever, aprendeu 56 sinais silábicos do seu conselheiro espiritual, cada um constituído por uma vogal ou uma consoante seguida por uma vogal.
Em 1910, quando ocorreu o aparecimento do cometa de Halley, Afáka sentiu-se convencido de que tinha sido dado um importante instrumento para a melhoria do destino da nação e começou a ensinar os sinais para o Ndyuka.
Todas as pessoas que aprenderam bem à escrita recebem o título de "bukuman". Afáka foi o primeiro ede-bukuman (chefe da associação de bukuman). Com a sua morte em oito de julho de 1918, Abena da aldeia Saaye, herdou o título e as responsabilidades. Antes de morrer, em 1960, Abena tinha formado o seu filho, Alufaisi Kasitioe, para usar a escrita. Alufaisi treinou André RM Pakosie sobre a maneira de ler e escrever. Em 1 º de julho de 1977, Alufaisi escolheu Pakosie como sucessor para o cargo de ede-bukuman. Quando Alufaisie morreu em 1993, Pakosie assumiu todas as responsabilidades relacionadas com a função de ede-bukuman. Ele lecionou a várias pessoas no Suriname e na Holanda o bom uso da escrita do Afáka. É a única escrita em uso na América - Africana que foi elaborada especificamente por um preto, sendo utilizada em sua grande parte no Suriname e também por maroons na Guiana Francesa.
Os saramakas também criaram um língua que é falada por 24.000 pessoas no Suriname e 2.000 na Guiana Francesa.
Surgiu a partir do contato entre os idiomas Inglês, holandês e línguas africanas (Kongo, Akan e Gbe) além de ter sido fortemente influenciada pelo Português falado pelos sefardins e seus escravizados que foram levados do Brasil. Os judeus sefardins foram grandes aliados dos holandeses e após a derrota destes se refugiaram no Guiana Holandesa onde continuaram como grandes proprietários de lavouras de cana-de-açúcar e de milhares de escravizados. Além disso, as palavras em Português compõem quase 40 por cento de seu vocabulário, incluindo alguns morfemas gramaticais. A língua sarmacaan e todas as línguas crioulas são uma afirmação da africanidade e resistência a língua do escravizador, pois quebra a ideologia do “totalmente domesticado”. Infelizmente alguns pretos e pretas se orgulham de falar e escrever a língua dos escravizadores (português, espanhol, inglês, francês, holandês) melhor do que eles.


A RESISTÊNCIA DA RELIGIÃO DOS ANCESTRAIS E A TENTATIVA DE EVANGELIZAÇÃO
Alabi viveu na segunda metade do século XVIII, foi chefe tribal dos quilombolas saramakas e o primeiro convertido ao cristianismo.
O registro escrito dos missionários que viveram nas aldeias saramakas se estende de 1765 a 1813 e constitui um relato pormenorizado de seu fracasso geral em ganhar almas de Satã, assim como um retrato tocante da resistência saramaka. Os textos foram escritos ao mesmo tempo para a congregação na Europa, enquanto registro inspirador dos sofrimentos e êxitos dos missionários, e como confissão pessoal a Deus, o forte sentido cuja imanência emerge de cada página. Esses textos dos morávios, ricos e teologicamente exóticos, colocam desafio sinalizador ao intérprete que busca compreender o encontro entre europeus e africanos deslocados na América colonial.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-71832004000100013&script=sci_arttext
As nações mantiveram a religião dos ancestrais apesar das inúmeras tentativas de evangelização da Igreja Moravia, fato este costumeiro de religiões brancas acharem que os povos pretos são adoradores de Satanás. Os moravios empreenderam diversas campanhas e conseguiu converter alguns lideres quilombolas. A questão das diversas igrejas cristãs e os quilombolas merece um artigo mais aprofundado.
A prática africana da religião das nações é uma preciosa forma de resistência, porque sabemos que toda evangelização é a destruição e satanização dos povos pretos. Atualmente cerca de 25 por cento são cristãos - principalmente da Igreja Moravia (alguns desde os meados do século 18), outros Católicos Romanos e, cada vez mais hoje, evangélicos de outras igrejas. A religião praticada pelas nações maroons é uma realaboração dos cultos ancestres africanos e uma reafirmação da africanidade. A base religiosa é de influência principalmente dos povos akan (Ashanti) (Gana), Ewe e Fons (Togo, Benin- antigo Daomé e Ocidente da Nigéria) e do estuário do rio Congo, a região do Lwango . A religião é conhecida por Winti e tem como base a adoração de um Deus Único Criador e Superior , cultos aos ancestrais e as forças da natureza.

Naks Wan Rutu Tapu Kromanti winti dance part2

Em 25 de fevereiro de 1980 o recém independente Suriname foi alvo de um golpe militar que se instalou no país até o início dos anos 90. Um dos principais líderes militares foi Desiré Delano Bouterse, o qual é acusado de diversos crimes e foi condenado na Holanda, o qual mantém um mandado internacional de prisão.
De (1986-1992) a nação saramanka e a nação djuka tiveram que reagir armados ao governo de Desiré Delano Bouterse e as forças do Exército , com uma organização de guerrilha liderada por Roony Brunswijk, ex-segurança do presidente Bouterse, que fundou o "Junglecommand" (Comando da Selva) que obteve um série de vitórias iniciais, a consequência foi uma violenta repressão das forças armadas, massacre, assassinatos, detenções e a fuga de mais de 10.000 quilombolas para a Guiana Francesa e locais escondidos em Paramaribo.
Atualmente a luta é das nações maroons no interior, são contra as poderosas madeireiras chinesas, mineradores de bauxita e de ouro, que representam interesses financeiros transnacionais.
Em 26 de junho de 2006 a Comissão Intermaricana de Direitos Humanos em conformidade com as disposições 50 e 61 da Convenção Americana apresentou um requerimento ao Tribunal da Justiça contra o estado do Suriname, conforme petição dos líderes dos doze clãs da nação Saramaka que alegaram violações do estado surinamês aos direitos a propriedade e a proteção judicial.

Saiba mais sobre a geografia, história das nações maroons no curso Geografia e História da América –Africana.

Nenhum comentário:

PRETAS POESIAS

PRETAS POESIAS
Poemas de amor ao povo preto: https://www.facebook.com/PretasPoesias