sábado, 8 de dezembro de 2012

A SABEDORIA DA LEBRE NOS CONTOS DE TIO REMUS - RESISTÊNCIA A ESCRAVIDÃO NOS CONTOS ANCESTRAIS





Por Malachiyah Ben Ysrayl - Historiador e Hebreu-Israelita
Skype: lindoebano
Facebook: Walter Passos

Ouvi diversas fábulas em minha infância contada pelos mais antigos, principalmente à noite, e algumas ainda guardo na memória. São fábulas cujos personagens eram animais personificados, sempre contendo conteúdo valorativo moral.

Hoje, compreendo terem sido relatos das experiências de milhares de anos que atravessaram o Oceano Atlântico com os ancestrais africanos, o que pode ser comprovado pelas inúmeras referências ao longo da história, especialmente nos contos da lebre.

As referências à lebre são abundantes na mitologia e literatura de Kemete (Egito). O deus Osíris, marido de Ísis, foi chamado de Un-Nefer, e retratado com a cabeça de uma lebre. Como Un-Nefer, A lebre também teve um poder simbólico em Kemete (Egito) desde os tempos imemoriais o deus Osíris com a cabeça de lebre anualmente recebia sacrifícios  para dar vida ao Rio Nilo, concomitantemente possibilitar a sobrevivência da sociedade kemetiana.


Deusa Wenet
  
A deusa lebre, guardiã do outro mundo, citada no livro dos mortos.
A lebre também aparece como um sinal hieroglífico. Este hieróglifo que é chamado de "Wn" simboliza a essência da própria vida, e retrata uma lebre sobre uma onda única de água, a própria substância de que a vida surgiu das águas primordiais de Nun em antigos mitos de criação de Kemete.

A lebre possui na África um simbolismo de renascimento. Conta-se em uma mitologia que a Lua queria dar aos humanos a imortalidade e enviou a lebre como mensageira:

- Assim como a Lua morre e ressuscita assim será você. Disse a Lua à lebre.

Mas confundido a mensagem, a Lebre divulgou disse:

- Assim como a lua morre e perece, assim serão vocês.

As pessoas da Terra acreditaram nessas palavras e tornaram-se mortais.

Quando a Lua ouviu o que a lebre havia feito, ela ficou tão irritada que bateu na Lebre com uma vara e dividiu o seu nariz. Mas como elas continuam a viverem juntas, têm reparado a sua amizade.

As civilizações da África Ocidental, Central e Austral possuem tradições narrativas da lebre que por sua esperteza e astucia na sobrevivência contra os predadores ensinam belíssimas histórias, sendo usadas didaticamente para o aprendizado.  No ocidente se estes ensinamentos ancestres africanos são conhecidos por fábulas onde se apresenta a lebre como um animal malandro.

Com inteligência, a lebre consegue sobreviver à hiena nos contos da África ocidental. Na Zâmbia é conhecida como Kalulu, enfrenta e engana o Leão.  Na Nigéria é considerada pela sua esperteza como um doutor.

Com a invasão da África e as guerras realizadas pelos europeus, os prisioneiros das guerras foram escravizados e sequestrados para as Américas e com eles vieram os contos didáticos das lebres.  Estes contos das lebres foram repassados através da tradição oral e usados como métodos de resistência aos escravizadores (predadores leões e hienas) que são representados na América pela raposa.

Os autores eurocentristas quando estudaram esses simbolismos de resistência africana na escravidão denominam a lebre de malandro, quando deveriam chamá-la de sabia, os quais constataram nas histórias do tio Remus.

Tio Remus foi uma série de histórias infantis escritas por Joel Chandler Harris, jornalista branco de ascendência irlandesa, que ouviu esses contos por escravizados quando viveu em uma fazenda em Plantation Turnwold. Harris passou centenas de horas na senzala, ele era menos autoconsciente e percebia a sua origem humilde como ilegítimo filho de cabeça vermelha de um imigrante irlandês, o que o ajudou a promover uma ligação íntima com os escravizados.

Ele absorveu as histórias, a linguagem, e inflexões de pessoas como o tio George Terrell, a velha Harbert e a tia Crissy.  Os contos afro-americano de animais que compartilhavam, mais tarde, se tornaram a base e a inspiração para Harris sobre os contos de Tio Remus. George Terrell e Old Harbert, em particular, se tornaram modelos para Tio Remus, bem como modelos para Harris.

A primeira história foi publicada em 20 de julho de 1879 e o primeiro livro em novembro de 1880. Até os dias atuais os contos do Tio Remus já foram traduzidos para mais de 40 idiomas.

As lições aprendidas  da personagem fictícia  Tio Remus demonstram que o mais fraco (escravizados pretos) puderam, muitas vezes, triunfar sobre uma força física superior (senhores brancos), utilizando seu intelecto. Outro fator importante no trabalho foi à manutenção nas histórias dos falares dos pretos do sul dos Estados Unidos da América.


No período da luta dos Direitos Civis alguns setores criticaram a personagem tio Remus como um escrito racista, não sendo a totalidade dos pretos americanos.

A Disney produziu “Canção do Sul”, em 1946, com Tio Remus e seus amigos animais animados. A produção contou com atores mirins em um enredo e definição favorável ao Tio Remus entrelaçamento seus fios sobre a lebre e a Raposa. Foi relançado novamente uma década depois.

O filme recebeu alguma reação negativa do público nos Estados Unidos, mas não tanto quanto poderia. Isso porque o filme nunca foi lançado em sua totalidade. Os executivos da Disney foram sábios o suficiente para prever algum conteúdo do filme pode ser visto como politicamente incorreto e racista.

A Canção do Sul (Dublado) Filme Completo





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quinta-feira, 15 de novembro de 2012

ESOPO - O AFRICANO CONTADOR DE FÁBULAS

 









Por Malachiyah Ben Ysrayl - Historiador e Hebreu-Israelita
Skype: lindoebano
Facebook: Walter Passos


A apropriação do conhecimento africano pelos europeus já vem sendo ventilada por estudiosos brancos, que sabiamente reconhecem o quão foi transformado a história da humanidade para glorificar o continente europeu, que aprendeu as ciências e as literaturas com os povos africanos.  Evidente que o trabalho dos afrocentristas os tem feito repensar.

 A história é fato ocorrido, se descreve o mais aproximado da verdade, através dos diversos tipos de documentação e oralidade, ou falsifica-os.

Assim, apesar do avanço tecnológico e de novas personagens que surgem a todo o momento na literatura infanto-juvenil acompanhado as mudanças sociais, as antigas fábulas continuam marcantes como exemplificações no explicar do cotidiano. Os ensinamentos que recebemos sobre as fábulas que elas são de origem grega e surgiram através de Esopo, provavelmente no século VI antes da nossa era comum. 

Durante a Idade Média, Leonardo Da Vinci (1452-1519) as reescreveu em italiano e o escritor Jean de La Fontaine (1621-1695) obteve muito sucesso ao traduzi-las em versos para o francês.

As fábulas de Esopo são ensinadas continuadamente em salas de aula, pelos contadores de histórias, nas publicações das mais afamadas: A raposa e as uvas; A Cigarra e a Formiga; A tartaruga e a lebre; O vento norte e o sol; O menino que gritava lobo; O leão e o rato; O asno e a cachorrinha; A panela de barro e a de cobre; O velho e a mosca e muitos outros.

Coleção Disquinho - A Cigarra e a Formiga
 

Diversas imagens de Esopo foram produzidas e abaixo algumas delas:

Esopo, como descrito na Crônica de Nuremberg de Hartmann Schedel. Aqui ele é mostrado usando roupa alemã do século XV




A Xilogravura de  vida de Ysopet com suas fabulas historiadas (Espanha, 1489) descreve uma corcunda Esopo cercado por eventos das histórias em Planudes versão de sua vida.


Esopo mostrado no vestido japonês em uma edição de 1659 das fábulas de Kyoto: Isopo Monogatari

 Rhodope, apaixonada por Esopo; gravura de Bartolozzi, 1782.


Moeda da antiga cidade de Delphi com a imagem de ESOPO e a estátua helenística bem posterior

São diferentes imagens em diversas culturas que demonstram a imagem de Esopo. Mas, vem à pergunta: Esopo foi oriundo de qual nação? Ou uma personagem fictícia grega que relatou as diversas formas de ensinamentos morais através de fábulas? Quem foi Esopo? Qual era a sua cor epitelial e de onde vêm os ensinamentos?

Esopo foi um africano. Um homem preto sábio atestado pelos próprios gregos que levou para a Grécia os ensinamentos africanos, fato esse corriqueiro no mundo antigo, onde os gregos aprenderam as ciências e a mitologia em Kemete. Os escritores gregos escreveram que Esopo era de origem africana vindo da Etiópia como escravizado. 

O romance Esopo de autoria anônima escrito entre o I e II séculos da nossa era comum o descreve:
"de aspecto repugnante... barrigudo, disforme de cabeça, nariz arrebitado, anão, moreno, pernas tortas, vesgo, lábios grossos, uma monstruosidade portentosa.”

Um ódio dos gregos ao seu mestre!

Em 2002, Richard A. Lobão citou o número de animais africanos e "artefatos" nas fábulas de Esopo como "provas circunstanciais" que pode ter sido um contador de historias da Núbia. 

William Godwin em Fábulas antigas e modernas (1805) tem uma ilustração de Esopo relatando suas histórias para as crianças pequenas que dá suas feições uma aparência distintamente africana.

Em 1932, o antropólogo JH Driberg, repetindo a ligação Esopo / Aethiop, afirmou que, embora "alguns dizem que ele (Esopo) foi um frígio... a visão mais geral... é que ele era um Africano”, e "se Esopo não era um Africano, ele deveria ter sido.”

Steinhowel Heinrich, edição de 1476, muitas traduções das fábulas em línguas européias, que também incorporou Vida Planudes de Esopo, contou com ilustrações retratando-o como um corcunda.

Outro exemplo, a edição de 1687 das Fábulas de Esopo e sua Biografia: em inglês, francês e latim, incluiu 28 gravuras criadas por Francisco Barlow, que o mostram como um corcunda anão e suas características faciais parecem estar de acordo com a sua declaração no texto : "Eu sou um negro".

Esopo como preto pode ter sido incentivado por uma similaridade percebida entre fábulas do Malandro Coelho Br’er, contadas por escravizados Africano-Americanos, e o papel tradicional do escravizado Esopo como "uma espécie de herói da cultura dos oprimidos, e sua vida como um manual de como fazer para a manipulação bem sucedida de superiores”.

Nesta mistura de live action e animação, duas crianças negras passeiam em um bosque encantado, onde lhes são ditas fábulas de Esopo que diferenciam entre ambição realista e irrealista. Sua versão de A Tartaruga e a Lebre ilustra como tirar vantagem da confiança sobre um oponente.

Diversos escritores e filósofos gregos e romanos citam as fábulas de Esopo: Heródoto (o pai da história branca) chama Esopo de "escritor de fábulas".  Aristófanes menciona a "leitura" de Esopo, assim também o faz Sócrates, Fedro, Sófocles, Demétrio de Phalerum, Babrius, entre muitos outros. 

Nós sabemos que as fábulas de Esopo são ensinadas na cultura popular ao longo dos últimos 2.500 anos, em várias obras de arte, livros, filmes, peças de teatro e programas de televisão, demonstrando animais que falam, brincam, erram e trazem lições morais complexas. As sábias fábulas do preto Esopo retratam o ser humano com virtudes e erros, que até hoje servem como formas didáticas de aprendizado. 

Será que a premiada atriz Ana Luísa Lacombe,  em sua peça teatral as Fábulas de Esopo, informa que está trabalhando ensinamentos africanos?

Trilogia Faz e Conta - cenas de Fábulas de Esopo, Lendas da Natureza e O Conto do Reino Distante

Por que na entrevista o escritor Mauro Rubens da Silva não informa que está trabalhando com contos africanos? 

Livro Inteligente e as Fábulas de Esopo na AllTV

Diversos pedagogos e escritores usam e usaram as fábulas de Esopo, inclusive Monteiro Lobato.  Quais deles informaram a africanidade desses contos? O que se tem de ensinar é que Esopo e as suas fábulas são africanas. Você, educador(a), lecione às nossas belas crianças a riqueza de uma África ainda desconhecida pelo saber que embelezou e embeleza o mundo.

Shalom!



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Poemas de amor ao povo preto: https://www.facebook.com/PretasPoesias