quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O CARNAVAL UMA FESTA AFRICANA – COMEMORAÇÃO DO ANO SOLAR AFRICANO


Por Walter Passos
, historiador, panafricanista,
afrocentrista, teólogo e membro da COPATZION (Comunidade Pan-Africanista de Tzion).
Pseudônimo: Kefing Foluke.
E-mail: walterpassos21@yahoo.com.br

Msn: kefingfoluke1@hotmail.com

Skype: lindoebano



Na Bahia, milhares de descendentes de africanos estão puxando as cordas dos blocos: os chamados cordeiros.

Estes homens e mulheres pretas retratam a discrepância étnico-socioeconômica de uma minoria abastada (branca) e da maioria despossuída (preta), que aproveita este período momesco para obter uma renda extra, sem ter consciência de que fomenta uma sociedade discriminatória, estão nas ruas recolhendo latinhas, vendendo cerveja, comidas e lanches e a sua força física, envolvidos em possíveis atos de violência que surge em uma aglomeração de mais de dois milhão de foliões.

O consumo exacerbado pela juventude de bebidas alcoólicas e outras substâncias que inibem a timidez e trazem momentos de uma falsa alegria.

O carnaval é uma festa para brancos e ricos que podem dispor de dinheiro para pagar os caríssimos blocos empurrados por trios elétricos, em uma cidade de esmagador contingente populacional de pretas e pretos. Estes que inconscientemente permitiram a apropriação dos ritmos e danças de origem africana, inclusive aspectos de sua religiosidade fazem parte da festa, não ocorrendo este fato com as religiões cristãs.

Os pretos e pretas não usufruem diretamente dos milhões de reais que geram nesta empresa chamada carnaval baiano. Isto sem falar nas Escolas de Samba do Rio de Janeiro e São Paulo que se tornaram cartões postais do Brasil para o mundo, em que suas comunidades, antes organizadoras dos desfiles, hoje não mais detêm o controle da festa nem das escolas, estas que em sua maioria são dominadas por homens brancos. Mas, tudo é festa, é carnaval, a maioria do nosso povo está “feliz” pra tudo terminar na quarta-feira.

Apesar de todas estas contradições o carnaval foi uma maneira de se ativar a consciência dos afro-baianos sobre as questões da negritude, de afirmação racial através do lúdico, especialmente nos bairros denominados periféricos, com o surgimento de blocos como: Bloco Afro Ilê-Ayê na Liberdade; Olodum no Centro Histórico; Muzenza, com seus extintos ensaios na Ribeira, e posteriormente na Liberdade; Araketu em Periperi; Badauê no Engenho Velho de Brotas e tantos outros.

As manifestações africanas trouxeram em um momento histórico o dizer não à branquitude dos blocos de trio e a alegria de afirmar na música do Ilê Aiyê:

Que bloco é esse? Eu quero saber.

É o mundo negro que viemos mostrar pra você (pra você).

Que bloco é esse? Eu quero saber.

É o mundo negro que viemos mostrar pra você (pra você).

Branco, se você soubesse o valor que o preto tem.

Tu tomavas banho de piche, branco e, ficava negrão também.

E não te ensino a minha malandragem.

Nem tão pouco minha filosofia, não?

Quem dá luz a cego é bengala branca em Santa Luzia.


Ilê Aiyê carnaval 2008



O carnaval é comemorado em diversas regiões da América Africana e na África:








A origem das festividades populares neste período é estritamente africana, apesar dos relatos eurocêntricos afirmarem que a origem desta celebração popular foi a Europa, sendo adaptada pelos africanos escravizados, há omissões históricas das origens. Evidente de que os europeus se apropriam do conhecimento africano e colocaram uma nova roupagem, nesse caso reinterpretaram as grandes festas africanas, relacionadas às colheitas, deturpando-lhes o verdadeiro sentido.

A história das celebrações está relacionada ao princípio da nossa civilização, na origem dos rituais, na fertilidade e na colheita das primeiras lavouras às margens do Nilo, em que os primeiros agricultores celebravam-nas com danças e músicas.

Estas festividades possuem sua origem no antigo Egito (Khemet) como celebração do Ano Novo Solar Africano, isto é, o Ano Novo Solar em Khemet, em que era reconhecida a importância do sol e do rio Nilo na vida dessa população, que fora precursora de diversas ciências e tecnologias, a exemplo da astronomia e as ciências naturais, entre tantas outras.

O ritmo da vida egípcia estava em torno do Nilo, onde a linhagem real, a autoridade para governar, a religião e a ciência estão intrinsecamente interligadas durante seus onze mil anos de existência. A comemoração do carnaval está ligada intrinsecamente à deusa egípcia Isis e se festejavam 05 dias de folia com muita pompa.

Os festivais do antigo Khemet tinham a intenção de sintonizar os celebrantes com os ciclos da natureza e do universo através da simbologia do mito e do ato sagrado do ritual. Eles apontavam para a natureza, com a celebração da lua minguante no inverno, o retorno de um novo ano, e da fertilidade.

A apropriação histórica infelizmente existe na história das nações invasoras, e ainda hoje livros eurocêntricos divulgam, ensinam essa e outras “verdades”, negando e omitindo suas verdadeiras origens: o continente africano.

Já na sociedade grega modificaram-se os rituais, acrescendo a bebida e o sexo, com as celebrações dionisíacas, cultos ao deus do prazer: Dionísio.

Na Roma Antiga, as festividades foram conhecidas como bacanais, saturnais e lupercais, em que festejavam respectivamente os deuses Baco, Saturno e Pã. Nas sociedades européias começaram a aparecer os primeiros grupos de travestidos, homens vestidos de mulher. Nestas também foi acrescentada uma função política de distensão social às celebrações, tolerando o espírito satírico, a crítica aos governos e governantes nos festejos.

As celebrações pagãs do antigo Império Romano, relacionadas com a chegada do Ano Novo e da primavera, persistiu mesmo após o triunfo do cristianismo pagão com a forma de carnaval. Num sentido religioso, esta festa era a última oportunidade que as pessoas tinham para abastecer o corpo com abundantes alimentos e bebidas antes de começar a época da Quaresma, que representou o jejum e a penitência. Carnaval é assim, às vezes chamado de Anti-Quaresma.

Nesse sentido, a palavra pode ser interpretada como "Carne Vale", em latim significa "adeus carne", "carnaval", na verdade, deriva de "navalis carrus": o "carro naval" ou navio, que carregava o Deus do Mar celta ou germânico, de sua morada do Norte para as festas de inverno. Em Roma, na abertura dessas festas ao deus Saturno, carros buscando semelhança a navios saíam na "avenida", com homens e mulheres nus. Estes eram chamados os carrum navalis.

Muitos dizem que daí surgiu a expressão carnevale. Os europeus adaptaram os carros alegóricos que existiam na Babilônia, em honra do deus Marduk, e no Egito, para a deusa Isis, a rainha-deusa da vida e da luz, que abre o ano. E nas festas romanas se elegia o príncipe do carnaval para reinar na folia.

O novo olhar grego e romano resultou na modificação das festas de colheitas africanas, perdeu-se o sentido da celebração do novo ano solar e da benignidade do rio Nilo e a criação de novas tecnologias que serviram para o bem estar das comunidades primevas africanas.

As mudanças realizadas por estes deturpantes olhares europeus tiveram continuidade na Afro-América, especialmente no Brasil, com festas de total ausência da solidariedade africana, que hoje louvam deuses greco-romanos remodelados: o dinheiro, a desigualdade sócio-étnica e a perversão sexual.

Trinidad Carnival 2009(w/ BAMABAC & PULSE 8)


8 comentários:

Anônimo disse...

Interssante a história, e triste ao mesmo tempo, por vários motivos: primeiro é triste saber que essa festa que desagrada a Deus tem origem na Africa, mais triste ainda é que o povo de origem africana continua participando da festa ou fazendo com que ela funcione.
Se os gregos pioraram as comemorações com orgias é outro fato extremamente demoníaco... triste, muito triste saber que mais uma coisa demoníaca tem origem na Africa.
Será que algum cristao tem dúvida que o carnaval desagrada a Deus?

Anônimo disse...

Muito bom!
Excelente texto.

Déia Poeta disse...

CARNAVAL

Sete dias de alegria.
Dias de esquecimento dos problemas.
Dias de fantasias.
E radiografias...
Estupros.
Vícios.
Orgias precoces.
Cegueira!
Todos prostrados
Ao deus carnaval...
E no seu quintal o lixo fedido.
A seca.
A corrupção.
A fome.
Medidas provisórias.
Enquanto isso...
Na Carlos Gomes.
Castro Alves.
Campo Grande.
Barra.
Todos sambam.
Tudo vai às mil maravilhas.

Bete disse...

Excelente texto, com informações surpreendentes!

***
Morei no Engenho Velho de Brotas por dois anos, quando criança. Tinha um medo daquele dique! (será q ainda existe?)...kkkk
Também lembro perfeitamente dos vizinhos se arrumando com suas "mortalhas" (assim que chamavam as fantasias) para sair no bloco. Um ficava encarregado da comida e os demais faziam uma "boquinha" na casa dele, antes de sair para não ir de barriga vazia (caruru, peixe, arroz, carajé, huum)...passou um filmezinho na mente agora.kkk

***
Hoje penso que momentos como esses deveriam ser usados também para lições de cidadania. De direito do povo. Nunca vi nenhum momento de conscientização nessas reuniões; de valorização do nosso povo inseridos numa sociedade cerceadora dos seus direitos. É uma pena!
(mesmo aqui em São Paulo, quando ainda tentava gostar dessa festa na adolescência, para "não negar a raça" - rs - não via nenhuma atitude para promover amor, união, paz para o povo preto)

***
Carnaval se tornou ha muito tempo (e o texto comprova) um ambiente para tudo ruim mesmo, infelizmente.

Unknown disse...

Apesar de não comemorar ou festejar o carnaval, acredito que hoje num mundo globalizado onde vivemos, se pudéssemos usar essa que é a maior manifestação popular do mundo, para conscientizar o nosso povo de seu verdadeiro valor, com certeza isso teria um impacto considerável. Oxalá que um dia consigamos ver nossa gente que por natureza é muito inteligente possa aproveitar de forma inteligível essas manifestações. abraços e parabéns pela matéria.

Unknown disse...

Valter, parabéns por essa matéria, só acho uma pena que o nosso povo não aproveite essa que é a maior manifestação popular do mundo, para mostrar o nosso valor, mesmo por que os blocos á excesso dos Afros e Afoxés, não passam de um mesmismo irritante que não nos traz nenhuma mensagem que possa enriquecer nossa cultura ou algo que o valha.Oxalá que um dia consigamos ver nossa gente mostrar para todos o valor que o Preto tem como diz o ILê Aiê.

Anônimo disse...

Em uma sociedade muito erotizada, como é o caso do Brasil, na qual o excesso de estímulo procura mascarar um problema mais sério, oriundo de uma postura ainda infantil e auto-repressiva em relação à expressão sexual sadia, pode ser positiva a existência de uma festa ou período do ano em que se favoreça, ao menos ideologicamente, uma descarga do excesso de libido. Isso não tem a ver com religião, tampouco está o ser humano médio em condição de dizer o que agrada ou não a Deus, pela própria impossibilidade de a criatura, em sua pequenez, mergulhar na mente de seu Criador. É cedo para julgar os Africanos, pois possuem cultura muito mais antiga do que a brasileira, que ainda busca a própria identidade. Como nação, somos ainda um país adolescente e, por consequencia, deveras ingênuo.

Anônimo disse...

Olá Irmão! Sou negro de Portugal e gostaria de deixar o link do seguinte DOCUMENTÁRIO para você e todos os que lêm este blog. Pesquisem que vale a pena mesmo!o filme completo esta disponivel algures na net. ABRAÇO!

http://www.youtube.com/playlist?list=PLAB6C3543EA786F34

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