sábado, 19 de setembro de 2009

BRUXARIA BRANCA - A EXPRESSÃO DO MAL


Por Walter Passos, historiador e teólogo Pseudônimo: Kefing Foluke. E-mail: walterpassos21@yahoo.com.br
Skype: lindoebano

Facebook: Walter Passos

As crianças, independentes de cor epitelial e prática religiosa, têm receio e curiosidades em relação a bruxas e fadas. A didática através do lúdico as insere no mundo da fantasia criado pelos adultos, em uma realidade controversa e de explicações através das fábulas de problemas não resolvidos.
Todos os povos e civilizações sempre tiveram códigos de moralidade e de costumes, entretanto, o desconhecimento de outro grupo cultural cria falsas respostas através de ideologias discriminatórias. Os questionamentos de gerações afloram nos contos, nas mitologias do poder e de identidades dos grupos sociais, e nestas análises as respostas estão inacabadas, gerando conflitos, surgindo à necessidade didática de final feliz para o grupo social que idealiza a fábula, conforme as suas aspirações sociais e influências religiosas.
Neste sentido, os povos que sofreram invasões e foram escravizados encontram nas fábulas e mitos do invasor e escravizador referências deturpadas de si mesmo, pois são forçados a se encontrar no pertencimento do outro e, aprendem a desprezar os seus contos e mitos, seja por desconhecimento de sua história ou rejeição de sua ancestralidade.
Quando conhecemos o mundo, a mulher nos é apresentada como símbolo do amor materno, sabedoria, religiosidade, compreensão e poder. Para a criança o ato de “falar com a minha mãe!” tem um significado muito forte. O ato da comunicação torna-se instrumento de pertencimento com aquela que teve o poder da procriação e manutenção da vida.
Nas sociedades europeias e em seus contos a mulher é representada como detentora do poder mágico da bondade, como as fadas (a mulher submissa sempre atenta aos desejos do homem) bruxas e feiticeiras (simbolizada da perversão e maldade, questionadoras do patriarcado).
A maioria das crianças conhece o Conto Branca de Neve e os Sete Anões, da relação conflituosa, gerada pela disputa de beleza física, entre a protagonista com sua madrasta, uma rainha-bruxa. O clássico cinematográfico da Disney foi premiado com um Oscar especial da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. A história finaliza com a quebra do feitiço do sono eterno por um beijo do príncipe, que vive “feliz para sempre” com branca de Neve, a mais bela, notadamente por ser a mais branca, como o nome já sugere. Incrível que muitos aniversários de crianças, a idéia de ser uma princesa como a branca de neve e encontrar um príncipe encantado é um sonho de milhões de meninas pretas.


Branca de Neve e os Sete Anões - Filme Completo Parte Única



Estes estigmas são perpassados e formulam identidades que influenciam civilizações neste mundo globalizado, através dos diversos meios de comunicação e muitos o são adaptados conforme as concepções ocidentais.
Aparentemente essa idéia de fadas, bruxas e feiticeiras nada de mal trazem, porque no conceito da ideologia eurocêntrica a criança conhecerá o mundo e poderá trabalhar as diversas facetas de um diamante que está sendo lapidado para a vida toda.
Outro exemplo são os livros da escritora britânica J. K. Rowling da série Harry Potter com mais de 550 milhões de cópias vendidas - ocupam o quarto lugar no ranking dos livros mais vendidos da história da humanidade, além de se tornarem filmes campeões em bilheterias. Nestes a maioria das ações se passa na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwart onde ensinam a considerar os que não são bruxos de trouxas.
Inclusive a idéia de bruxas e fadas está dentro do cristianismo de forma explicita. Muitas igrejas cristãs recomendam o filme - As Crônicas de Nárnia: O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa -, considerado conto de fadas cristão, adaptado do livro de Clive Staples Lewis, conhecido como C. S. Lewis. Foram vendidos mais de 200 milhões de cópias dos 38 livros deste autor irlandês e membro da Igreja Anglicana, os quais foram traduzidos para mais de 30 línguas. Lewis é considerado por muitos como o maior escritor cristão que o mundo já teve, e as suas obras são recomendadas por homens e mulheres formadoras de opiniões, citada por pregadores, estudadas em faculdades, nos seminários e nos institutos bíblicos. É comum ouvir em certos púlpitos mensagens onde Lewis é mais citado do que Yahoshua, e seus livros de referencial em lugar da Sagrada Bíblia.
O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa, tem uma interpretação sob o ponto de vista cristão, o Guarda-roupa representa o mundo espiritual, a Feiticeira Branca representa o inimigo das nossas almas (Satanás) e o Leão, representa Yahoshua, o Leão da Tribo de Judá, o Senhor de todos os homens. Após Aslam (o Leão) se entregar em favor de Edmundo (a redenção de Yahoshua, para cobrir seu erro arrependimento), ressuscita selando a vitória sobre o inimigo. Para uma grande maioria dos cristãos é uma maneira de evangelizar as crianças, e a bruxaria europeia é sagrada, não demoníaca. Demonizar bruxas, feiticeiras, magos, fadas, gnomos, druidas, e outras figuras brancas contidas nos contos europeus são um ato de rebeldia, racismo ou heresia.

Aslan and Jesus Christ's Crucifixion and Resurrection



Os conceitos do viver africano e afro-diásporico não deveriam ser baseados no pensamento ocidental eurocêntrico e suas experiências de fadas e bruxas, porque não trazem as realidades históricas e mitológicas africanas, e as crianças pretas introjeta falsas sonhos-realidades do mundo que só servem para baixar a autoestima. Os contos de fada numa visão junguiana são uma representação simbólica de problemas gerais humanos e suas soluções possíveis, só que os simbolismos eurocêntricos e suas respostas existências são diferentes e muito diferentes para nós.
Desde a nossa tenra infância aprendemos a respeitar e admirar as vovós, as tias e todas as senhoras da nossa convivência, porque as nossas mães nos informaram que as mesmas eram detentoras de ensinamentos antigos e inclusive conheciam os segredos de realizar um bom parto, rezar o corpo contra o mau-olhado e receitar remédios das folhas. Já tomamos muitos banhos de folha nas nossas vidas e já tivemos o corpo rezado por senhoras pretas. Nunca ouvi a minha mãe e minhas tias se referirem as idosas como bruxas ou feiticeiras. O nosso povo sempre respeitou os mais idosos, e ainda é educada a prática de pedir a benção aos mais antigos, forte lembrança de pessoas da minha geração que lêem este artigo.
O Povo preto é um povo que amava os idosos e os respeitavam pelo conhecimento do mundo. É gostoso ouvir em reuniões aqui em Salvador quando um idoso (a) recebe o respeito dos mais novos, demonstrando que a força da ancestralidade ainda não foi destruída por total pelas influências cristãs ocidentais.
São deprimentes as conceituações e divulgação do poder da mulher africana e afro-diásporica nos novos paradigmas criados pelo cristianismo: de detentoras do conhecimento ancestral para perversas feiticeiras e bruxas ocidentais. O que tem levado essas mudanças na criação de novos juízos de valor sobre o conhecimento das mulheres pretas?
Desde a chegada dos primeiros missionários na África começou a perseguição às detentoras do conhecimento, e inseriram nos seus discursos a mudança, outrora mulheres sábias foram consideradas “bruxas” e feiticeiras. A “bruxaria e feitiçaria” são conhecimentos ancestrais perpassados das diversas tradições, representando símbolos que proporcionam uma sensação de familiaridade e continuidade da experiência do viver das comunidades.
O filme Kiriku e a Feiticeira precisa de uma análise mais aprofundada sobre as relações de poder da mulher e feitiçaria sobre a ótica afrocentrada. A feiticeira Karaba no final segue a linha eurocêntrica de encantos e desencantos e casa-se com Kiruku e todos ficam em paz.
KIRIKU E A FEITICEIRA (PARTE 8/8)

As invasões europeias e seus modelos filosóficos afetaram profundamente as culturas ancestrais criando novas realidades socioeconômica e política, e os resultados desastrosos do colonialismo, capitalismo e modernidade corrompem o mundo invisível, desequilibrando processos naturais e espirituais do bom viver visível e outrora equilibrado. A antropologia, a filosofia, a sociologia e a história e seus conceitos eurocêntricos ainda tem discipulado entre as academias, africanos e afro-diásporico na defesa e propagação de suas análises, servindo como ciências não somente observadoras e críticas, mas decisórias para explicar modos e comportamentos de sociedades milenares com a ótica do invasor e colonizador.
As sociedades africanas e afro-diasporicas analisadas por xenófobos, individualistas que temem e não entendem o desconhecido e classifica-os como inferior, tornam-se necessário que usemos as nossas metodologias afrocentradas para darmos respostas as ciências que tenta nos destruir, deve ser por isso que tenho críticas às academias, porque não desejo e nem almejo os seus títulos de conhecimento eurocêntrico.
O conhecimento africano é baseado na solidariedade e os conflitos ocorridos possuem em seus mitos diferenças explicitas nas suas resoluções, os que visam o bem estar coletivo e não a individualidade. Quando se ensina as crianças acerca das yabás e das Yami Osorongá, através da oralidade da palavra verbalizada, entendem-se o seu poder de resolução dos problemas sociais, essas chamadas de “feiticeiras” que representam as forças da natureza e equilíbrio social diferem filosoficamente das malvadas bruxas e das “bondades das fadas”, apesar de que muitas das mitologias helênicas foram apropriadas do conhecimento africano, inclusive conceituações metafísicas já conhecidas e desenvolvidas no Vale do Nilo.
O empobrecimento dos africanos, as mudanças alimentares, o aumento das doenças, como o ebola e a AIDS, a destruição de áreas agrícolas e transformações no modo tradicional de cultivos, o desprezo pela solidariedade, a quebra da respeitabilidade pelos anciãos e anciãs, e a desconfiança do poder das mulheres, resulta na intensificação da procura de dinheiro, no desejo incontido de adquirir bens materiais, influenciadas pelas famosas teologias da prosperidade (ideologia capitalista travestida de religiosidade), fez com que as tradições sejam progressivamente desprezadas e ignoradas. Tornando os africanos e afro-diásporicos alvos mais fáceis de controle e dominação, porque quando duvidamos das nossas tradições e desprezamos a nossa ancestralidade estamos cometendo suicídio espiritual e físico, que amaldiçoa o legado ancestral e cria uma geração corrompida e envergonhada de ser o que é.
O entendimento do que chamo de choque cultural entre os africanos e os caucasianos, se dá em todos os sentidos da existência, porque as nossas tradições não separam o corpo em dicotomia e tricotomia, somos um ser integral conforme os escritos dos antigos hebreus. Com o advento da Cultura Helênica e sua apropriação e deformação do pensar africano, proporcionou a quebra da afrocentricidade e a divulgação filosófica da eurocentrismo.
A mudança no devir do ser preto especialmente pode tentar uma análise do mundo mágico branco e o mundo mágico preto. É um parâmetro inteligível do por que as mitologias são diferentes e as conceituações socio-religiosas são dispares, não sendo acentuada a bipolaridade do bem e do mal.
E conforme o Dr. LLAILA AFRIKA:

AFRICANOS:

  • Unificação do espírito, corpo e mente para o conhecimento.
  • Verdade e Mentira são diferentes
  • O Propósito do conhecimento e das ações é a justiça, a retidão e a precisão
  • Os Conhecimentos são conectados holisticamente.

CAUCASIANOS:

  • Fragmentação e Divisão para o conhecimento
  • Verdade e Mentira são as mesmas e corretas
  • O Propósito do conhecimento é o controle dos outros e o poder.
  • Os Conhecimentos são conectados por idéias fragmentadas.


Como vimos acima os modelos africanos e caucasianos são dispares em relação às vivências, retratam que os choques culturais deturparam violentamente a concepção de vida e relações com a natureza. Entender como o conhecimento ancestral das mulheres e o poder não somente simbólico como mágico foi afetado violentamente pela xenofobia européia, que pelo medo do diferente não compreendeu os conceitos e saberes não conhecidos, é uma caminho urgente dos praticantes da afrocentricidade, para reparar os males feitos as nossas crianças, criadas a imagem e semelhança das fadas e bruxas ocidentais.
As mulheres acusadas de bruxaria possuíam dentro do poder matriarcal e da construção matrilinear importância fundamental ainda existente e resistente dentro de muitos povos africanos que opõe a islamização e a cristianização.
As africanas são cosmopolitas como ainda são as mulheres pretas na América Africana e guardiãs do conhecimento. Na concepção europeia as mulheres sempre foram submissas, desprezadas e humilhadas, consideradas fontes de perversão e vitimas da inquisição, torturadas, queimadas e demonizadas. Consideradas objetos, propriedades do macho: bruxas as que resistem à opressão e fadas as que permitem os desejos masculinos. Por isso o surgimento do feminismo que é mais um ismo branco em contraposição a outra deformação, o machismo. Bem diferente dos conceitos afrocentrados de equilíbrio dos gêneros.
As mulheres pretas guardiãs do conhecimento foram primeiramente desacreditadas pelos missionários e pelo poder colonial, existem legislações em países africanos que as perseguem e as condenam, crianças e mulheres são assassinadas em diversos países pelo crime de bruxaria, acusadas por membros das comunidades, seguidores da falta de tolerância européia.
A perseguição as “Bruxas Africanas” pelo catolicismo e igrejas do protestantismo histórico tem se tornado mais violenta com a ascensão de cultos pentecostais e nopentencostais inclusive em uma disputa pelo poder. Estes grupos precisam mostrar poder diferente do maior poder que é o amor, criou no continente africano, a nova inquisição que parte para a destruição e morte de milhares de crianças e mulheres.
No Brasil a falta de respeitabilidade com as religiões de matriz africana por parte do cristianismo: católico, protestantismo histórico, pentecostais e neopentecostais, têm na gênese do racismo a vertente da idéia de religiões de bruxas e feiticeiras. Bruxalizar o conhecimento africano é a maneira mais eficaz de catequizar e converter milhões de africanos, escondendo séculos de opressão de bruxos cristãos e bruxas cristãos que trouxeram a desordem econômica e a escravidão.
A religião católica ainda tenta através da catequese, desestruturar tradições, como foi o caso da visita do papa Bento XVI em Angola quando apelou aos católicos à conversão dos adeptos da bruxaria ameaçados por “espíritos” e “poderes do mal” e afirmou que o Cristianismo era uma ponte entre as pessoas locais e os colonizadores portugueses.

PAPA BENTO XVI EM ANGOLA

Os europeus foram os grandes piratas na África e praticantes da xenofobia, com uma idéia de vida solitária e anti-solidária, divulgando o pessimismo, a individualidade e a ganância.
Entre todos esses fatores foi impossível para o europeu e o cristianismo se adequar a prática da solidariedade africana e tentaram destruí-la, necessitando, então, que o renascer africano e afro-diásporico tentassem recriar o pan-africanismo, porque deixou de acontecer por causa da divisão territorial, da escravização e colonização, resultando no continente africano transformações de xenofobia por xenofilia entre os primeiros seres humanos.
Na África e na Afro-América o medo dos conhecimentos ancestrais e as mudanças orquestradas determinando o diferente como inferior e demoníaco foram direcionados par abater a família, na representação feminina. “Bruxalizar” é quebrar o poder feminino, embrutecer os homens pretos, criar uma sociedade de órfãos, desagregando a família preta.
“Bruxalizar” tornou-se para os invasores cristãos e muçulmanos negar milhares de anos de conhecimento em todas as áreas da ciência.

2 comentários:

Amenhotep disse...

Shalom! As religiões de origem africana: udaísmo,Islamismo,Cristia nismo, Candomblé, etc; antes do contato com os povos asiáticos e europeus, sempre tiveram como a maior característica a TOLERÂNCIA.
Após o contato e a subsequente usurpação por estes povos, passaram a ter como principal característica a INTOLERÂNCIA.
Leiam Apocalipse 2:9 e 3:9. O apóstolo João bem sabia quem eles(brancos e "semitas" eram e continuam a ser.
João já os conheciam pelas suas obras.

Hotep!

NP disse...

Otima Materia Irmao Kefing...Muito pertinete este questionamente e muito contudente msm...Parabens..

Shalom a Todos.!

PRETAS POESIAS

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