sábado, 21 de maio de 2011

OS CONFLITOS DE BETA ISRAEL COM OS CRISTÃOS ETÍOPES – PERSEGUIÇÃO MILENAR AOS HEBREUS NA ETIÓPIA.



Por Walter Passos, Historiador,Panafricanista,
Afrocentrista e Teólogo.
Pseudônimo: Kefing Foluke.
E-mail: walterpassos21@yahoo.com.br
Msn:kefingfoluke1@hotmail.com
Skype: lindoebano
Facebook: Walter Passos.

É deveras complicado para muitas pessoas entender as interpretações histórico-religiosas sobre a Etiópia. O desconhecimento das populações do Vale do Nilo proporciona uma historiografia e analises étnico-sociais duvidosas, obtusas e confusas difundidas por escritores e pensadores eurocentristas, acadêmicos pretos, estudiosos religiosos e grupos afro-americanos.

Durante toda história etíope, advieram diferentes interesses econômicos que conseqüentemente geraram conflitos pelo poder político, tais conflitos alteraram a tradição oral e as concepções do sagrado. São distintas cosmovisões anacrônicas em um mesmo território e sempre estiveram em conflito, apesar de no primeiro olhar parecerem estar entrelaçadas. Sendo assim, é muito importante a compreensão desses ethos pelos afro-diaspóricos, principalmente os grupos que se utilizam daquela ancestralidade na fundamentação de seus posicionamentos filosóficos e religiosos.

A Etiópia, décimo maior país da África em extensão territorial, abrange cerca de 1.138.512 km² e principal constituinte da região conhecida como Chifre da África. É limitada a norte e a nordeste pela Eritréia, a leste por Djibuti e Somália, a sul pelo Quênia e a oeste e a sudoeste pelo Sudão.
A Etiópia é conhecida por suas medalhas de ouro olímpicas, igrejas esculpidas em rochas, o lugar onde se originou o grão de café e por ser um dos locais descritos pela ciência como origem dos primeiros seres humanos.

Há cerca de 80 diferentes grupos étnicos na Etiópia, os dois maiores são: Oromo e Amhara, ambos falam línguas afro-asiáticas. O grupo Oromo (Galla) é aproximadamente 40% da população e concentra-se principalmente na parte sul etíope. Os grupos Amhara e Tigrean correspondem a 32% da população e tradicionalmente dominam a política etíope. O grupo Sidamo vive nos sopés ao sul e nas regiões de savana correspondendo a 9%, enquanto o Shankella compõe cerca de 6% da população e residem na fronteira ocidental. O somali (6%) e Afar (4%) habitam as regiões áridas do leste e sudeste. Os povos do Nilo vivem no oeste e sudoeste ao longo da fronteira do Sudão. O Gurage representam 2% da população, e 1% restante é composto de outros grupos. O Beta Israel (chamados pejorativamente de Falashas e conhecidos como "judeus negros") vive nas montanhas de Simen e atualmente são cerca de 4.500 pessoas, isto porque a maioria dos 140 mil migrou para Israel. Outros grupos minoritários como os Beja vivem na região norte, o Agau no planalto central, e o povo Sidamo na encosta sul e regiões da savana são os remanescentes dos primeiros grupos que habitaram a Etiópia.


FACES OF ETHIOPIA



Entre os diversos grupos que formaram a história etíope, dois nos dão subsídios ao que desejamos pontuar: Beta Israel e os membros da Igreja Ortodoxa Etíope (Igreja Ortodoxa Etíope Tewahedo, que se compõe pelas diversas etnias). E, na Afro – América, os seguidores da filosofia Rastafari que tem como referencial e utopia a Etiópia, pátria espiritual do movimento religioso Rastafari.

Logo, ressalto que não há pretensão em um artigo de um blogger escrever uma tese. O principal objetivo deste texto é iniciar uma discussão para entendermos melhor estas diferenças no território etíope, as causas e conseqüências do exílio dos hebreus de Beta Israel, a formação do cristianismo ortodoxo e a referencia da história etíope por grupos afro-americanos.

BETA ISRAEL

Beta Israel (Casa de Israel), erroneamente chamados de Falashas (estrangeiros), é formada por hebreus que saíram de Israel a milhares de anos atrás e depois de varias migrações se instalaram nas montanhas de Gondar na Etiópia, tendo como referência a terra dos seus ancestrais (Israel), sabedores que não pertencem originariamente ao território etíope.


IGREJA CRISTÃ ETIOPE

A Igreja Cristã Ortodoxa Etíope surge no século IV com a conversão do rei Ezana de Axum, foi um dos mais influentes e poderosos impérios mundiais e um dos primeiros a instituir o cristianismo como religião oficial de Estado. Saiba mais lendo o artigo: AXUM - AS IGREJAS ESCULPIDAS EM ROCHAS NA ETIÓPIA


Ethiopian Orthodox Church Song




RASTAFARI

A filosofia rastafari é pan-africanista, oriunda da interpretação de uma revelação do grande líder Jamaicano Marcus Garvey, tornando-se conhecida internacionalmente a partir da década de 60 do século passado, tendo como um dos principais objetivos a repatriação dos africanos nas Américas. Como disse, a Etiópia é a pátria espiritual do movimento religioso Rastafari.

Como vimos, são períodos linearmente diferentes que em certo momento na história se encontram: o Mosaismo de Beta Israel e o Cristianismo de Ezana criando conflitos de poder, perseguições e no século XX exílio para o primeiro grupo. Por outro lado, o Movimento Rastafari surge após a escravidão nas Américas, intimamente ligado à história da Igreja Cristã Etíope.

Os rastafaris que tem como um dos seus princípios a genealogia salomônica descrita no livro Kebra Nagast, assim legitimam as dinastias etíopes como descendentes diretos de Menelik, filho do rei Salomão e da rainha Makeda de Sabá. Devemos atentar que o Kebra Nagast apresenta Salomão como descendente da tribo de Judá, por isso os rastafaris elegeram o imperador etíope Haile Sellasie, como o Leão de Judá, o Mashiach (Messias). Título e função não reconhecidos pelo próprio monarca, um fervoroso seguidor da Igreja Ortodoxa Etíope Tewahedo.

Peter Tosh "Rastafari Is"



A Etiópia tem laços históricos com as três mais importantes religiões do mundo que se dizem abraâmicas. Foi um dos primeiros países cristãos no mundo, tendo adotado oficialmente o cristianismo como religião do Estado no século IV d.C. Mantêm algumas observâncias do Tora, como: a guarda do sábado, a circuncisão masculina após o nascimento e regras alimentares,entre elas, a proibição da ingestão de carne de porco. Além disso, as mulheres da Igreja Ortodoxa Etíope são proibidas de entrar nos locais de adoração quando menstruadas, cobrem a cabeça com um lenço e sentam-se separadas nas igrejas, os homens sempre à esquerda e as mulheres à direita (quando de frente para o altar).


Um importante diferencial da Igreja Etíope e de outras igrejas cristãs é a tradição de que Menelik levou a Arca da Aliança para a Etiópia. Sendo cristã compactuam com a concepção européia de um messias branco (Jesus Cristo) e não compactuam com a filosofia Rastafári sobre Haille Selassie como sendo o Messias. Na fé dos Rastas, Haile Selassie é reverenciado como Jah Ras Tafari I, o Messias, o “Cristo Negro” que ascendeu ao Trono do Rei Davi em Adis Abeba, capital da Etiópia.

Em certos escritos e vídeos alguns grupos rastafaris colocam Beta Israel como referência, causando uma enorme confusão.

Deixando essas duas linhas de interpretação da Igreja ortodoxa Etíope e dos Rastafaris, iremos nos centrar no conflito milenar entre a maioria etíope cristã e a minoria hebréia de Beta Israel. É muito importante pontuar que Beta Israel não aceita o Kebra Nagast, concomitantemente, não veio com Menelik conforme os escritos e tradição etíope. Beta Israel, segundo a sua própria oralidade, é da tribo de Dan (danitas) não são da tribo de Judá (judeus). Não aceitam a Trindade, ao contrário, são monoteístas, e tem como base de fé o Torá e o Tanach. Ignoram a tradição etíope e a filosofia rastafari. É importante ressaltar, que Beta - Israel e os hebreu-israelitas nas Américas não se utilizam do termo JAH, porque não existe no Torá e no Tanach. O nome do Eterno é YHWH e em muitos trechos do Tanach é citado como YAH.

Não confunda a tribo de Judá e a dinastia salomônica com Beta Israel que é da tribo de Dan. Não esqueçam Jacó (Israel) foi pai de 12 filhos, e originou as 12 tribos de Israel, sendo a tribo de José, dividida em duas: Mannasés e Efraim. Beta Israel e a dinastia salomônica foram para a Etiópia em momentos distintos e por razões diferentes, apesar de serem da descendência de Israel. Beta Israel não aceita como verdadeiro o cristianismo etíope.

Ressaltando mais uma vez, a história dos hebreus (Beta Israel) foi de extrema perseguição desde que o cristianismo chega à Etiópia, com as transformações da tradição oral e as novas concepções de poder criadas pela suposta dinastia salomônica. Neste sentido, no próximo artigo discorremos sobre a negação do Kebra Nagast por Beta Israel e as guerras de sobrevivência dentro da Etiópia dos hebreus da tribo de Dan (Beta Israel), enfrentando guerras violentas contra o império cristão axumita, perseguição do fascismo de Mussolini e vitimas da ditadura etíope, da guerra civil e da fome, até que fugiram retirados por tropas israelitas (askenazis), através da Operação Moisés (1984) e da Operação Salomão (1991).



Shalom!!!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

UMBANDA E O DIA 13 DE MAIO - DIA DOS PRETOS VELHOS



Por Walter Passos, Historiador,Panafricanista,
Afrocentrista e Teólogo.
Pseudônimo: Kefing Foluke.
E-mail: walterpassos21@yahoo.com.br

Msn:kefingfoluke1@hotmail.com

Skype: lindoebano

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Walter Passos.


Recordo-me da minha infância, quando crianças pediam a benção a uma idosa da cor de ébano que calmamente andava na rua onde morava, sempre no mesmo horário:

- A Benção, Vovó!

E ela respondia alegremente:

- Que Deus te abençoe, meu netinho.

Era uma zeladora de Umbanda. A Nós não nos interessa sua religião, porque ela demonstrava carinho e amorosidade com todos na mesma medida. Também pedíamos a benção aos padres capuchinhos, por interesse de ganhar laranja, uma benção, uma laranja. Até hoje não sei como aqueles homens idosos possuíam tantas laranjas. Era um pedido de benção interesseira.

Cresci indo a diversas sessões de umbanda, acompanhando o meu irmão que era fotografo na época, e quando já adolescente para jogar capoeira, antes das chamadas giras. Foi um bom tempo e muito aprendizado da diversidade religiosa brasileira. Sempre admirei a umbanda pelas suas propagandas de caridade e ficava impressionado por um dia ter visto um hospital umbandista no bairro de Mesquita - RJ.

Certa feita, ocorreu um fato interessante. Meu pai fora um comunista convicto, admirador da Rússia, de Carlos Prestes e do Partidão. Gostava de nenhuma religião, todavia solicitou a minha mãe que confeitasse um bolo para a festa de homenagem a São Jorge, em um terreiro de Umbanda, atendendo a um pedido de um zelador que era colega dele no Cais do Porto. Meu pai se orgulhava de ver os lindos bolos confeitados pela minha mãe e alegremente construía as suas armações. O bolo para São Jorge foi um dos mais belos que eu vi na vida. Mas, senti que a minha mãe o fez e o confeitou sem mostrar a mesma alegria como naqueles que fazia gratuitamente para as festas na Igreja Presbiteriana de Queimados -RJ, aniversários, batizados e de casamentos de jovens que ela gostava.

Meu pai foi estivador e na infância aprendeu o ofício de carpinteiro. Minha mãe, na época já era presbiteriana, não gostava de comentar o seu passado no candomblé, em Salvador-Bahia. Relatava que foi convidada para ser mãe-pequena. Viveu toda a sua infância, adolescência e inicio da vida adulta freqüentando e convivendo em terreiros de candomblé. O pouco que sei, e nada sei, das cantigas e danças cerimoniais foram mostradas através da minha mãe nos momentos de paciência e recordações. Ela me ensinou que Deus era conhecido por Zambi. Não gostava da Umbanda, achava muito diferente do candomblé e as danças “sem graça”.

Quando fui estudar teologia no Seminário Presbiteriano de Campinas-SP, um grande amigo me convidou para irmos a um centro de Umbanda pregar o evangelho e pela primeira vez vi a maioria dos fieis brancos. Nós entregamos folhetos na entrada daquele templo religioso, e após minutos de “evangelização” o sacerdote, um homem branco, calmo e paciente, nos convidou para entrar e falar da nossa fé. Logo em seguida, perguntou se ele podia ir ao seminário falar da Umbanda. Ficamos sem resposta, agradecemos e nunca mais tive a coragem de distribuir folhetos naquele templo.

Na década de 80 do século passado, a umbanda se transformou em estudos sociológicos dos teólogos protestantes. Apesar de contestações por estudiosos, foi considerada a religião que mais crescia; um fenômeno: a religião autenticamente brasileira.

Com o crescimento dos cultos neopentecostais e o acirramento exarcebado de ataques as religiões afro-brasileiras aumenta os episódios de intolerância religiosa, sendo a Umbanda a maior de suas vítimas. Acompanhei esse fato de perto, porque ministrei aulas de História da Igreja em um seminário da Igreja Universal do Reino de Deus, o qual foi precocemente fechado por ordens da direção.

Li um pouco da história da umbanda e sua linguagem popular que conseguiu quebrar preconceitos do espiritismo com a comunidade de descendentes de africanos. Sou a favor de toda a liberdade religiosa e de expressão, e de antemão, destaco que o cristianismo em suas diversas matizes é participe direto das mazelas do nosso povo. Fato este que a umbanda não foi.

O dia 13 de maio me traz ruins recordações: Na escola primária, todos os anos os colegas brancos e as professoras relembravam a data com sorrisos maléficos. E diziam frases como: “Agradeça a Princesa Isabel” ou “a culpa de vocês estarem aqui é da Princesa Isabel”. Eu estudei em colégios privados onde os pretos sempre foram minoria.

O dia 13 de maio é um dia festivo para a Umbanda, sendo comemorado o “Dia dos Pretos Velhos”. Abaixo, um vídeo exibido na Rede Globo em sua homenagem:

SAGRADO - Rede Globo comemora o Dia do Preto Velho - TV Globo (2011)



A mensagem trazida pelo vídeo é de amorosidade, de perdão e de esquecimento das mazelas que sofreram os escravizados no Brasil: “Destinados a todos que acreditam na humildade e no perdão”.

A escravidão dos africanos foi um crime lesa-humanidade nos conceitos atuais do direito internacional e todas as pessoas que lutam contra a discriminação racial interpretam desta maneira.

O 13 de maio é uma data controversa, poucas organizações a defendem como um dia realmente especial que merece comemorações, e historiadores proeminentes como Mario Maestri Filho já escreveu artigos sobre a importância revolucionária desta data. Por outro lado, a maioria das organizações do Movimento Negro coloca o dia 13 de maio como o “Dia Nacional de denúncia contra o Racismo”. O dia 13 de maio foi recusado pela maioria dos militantes que festejam o dia 20 de novembro, a maior data da comunidade preta, em homenagem a Zumbi dos Palmares.

A Umbanda está no primeiro grupo, tanto assim, que homenageia os “Pretos velhos” nesta data, sendo estes especiais para a existência desta religião. Achei deveras interessante, as análises feitas através da psicografia do Pai João das Almas, no site do POVO DE ARUANDA, publicado em 06 de dezembro de 2006, entre diversas informações destaco:

- A senzala era o único lugar onde o negro conseguia ser livre. Minha história de vida foi muito triste, mas aprendi muito. O sinhô era um homem muito refinado e não me tratava mal, mas a sinhá era uma mulher muito infeliz. Seu coração cheio de fel não sabia amar. Era temida e detestada. Por muito pouco mandava chicotear os escravos da senzala e o sinhô fazia todas suas vontades. Negrinhos eram afastados das suas mães, velhos escravos iam para o tronco e as escravas caseiras tremiam com as ordens da caprichosa sinhá. Eu não me queixava e jamais cultivei o ódio e a vingança. Alguns escravos odiavam os senhores com todas as forças até à morte. No plano espiritual, continuavam a perseguição perturbando os senhores com a força da magia negra e da vingança. Como é bom ser bom! Como é triste ser mau! Quantas lágrimas e sofrimentos os senhores plantaram através de suas atitudes. No entanto, todos caminharemos para a Eterna Felicidade! O caminho mais sublime é o Amor, mas alguns só evoluem através da Dor!

As palavras do Preto Velho são de extrema submissão e aceitação da escravidão, uma negação das lutas de resistência:
A senzala como local de liberdade:

A senzala era o único lugar onde o negro conseguia ser livre.

O elogio a passividade:

Eu não me queixava e jamais cultivei o ódio e a vingança.

A censura à resistência dos escravizados:
Alguns escravos odiavam os senhores com todas as forças até à morte. No plano espiritual, continuavam a perseguição perturbando os senhores com a força da magia negra e da vingança.

O senhor do escravizado sofria mais:

Pior que a escravidão os grilhões da maldade e do preconceito. Muito pior que nosso sofrimento era o peso dos pecados daqueles que oprimiam seus irmãos de cor.

Sobre o dia 13 de maio, conclui que teve uma vida sem lutas pelo povo preto na escravidão:

No dia 13 de maio, a alforria! No entanto, as lembranças marcaram minha vida para sempre. Foi minha encarnação mais proveitosa. Nessa vida de martírios, cultivei a renúncia e a humildade.

http://povodearuanda.wordpress.com/2006/12/06/pretos-velhos/

No município Rio de Janeiro se aprovou uma lei que institui o ensino de holocausto. Os judeus não esquecem e nem perdoam os crimes do nazismo. Imagine em um espaço religioso, um ancestral se dizendo judeu se manifestar como vítima das mazelas do nazismo e repetir as palavras do Pai João das Almas. Haverá uma contestação da comunidade judaica? O que você acha?

Para a maioria das organizações do Movimento Negro no Brasil no dia 13 de maio nada tem a ser comemorado, e sim, relembrar como um dia de protesto de uma abolição mal acabada, e conforme as frases do poeta Limeira: "Hábil Lição da escravatura." Para os espíritos desencarnados da Umbanda e seus seguidores juntamente com uma pequena parcela do Movimento Negro é dia de comemoração e de alegrias. Quem está com a razão?

domingo, 1 de maio de 2011

A MASSAI BRANCA – A VERDADEIRA FACE DO AMOR INTER-RACIAL


Por Aidan Foluke
,
Acadêmica de Enfermagem.
MSN: vanessasoares13@hotmail.com
Skype: aidanfoluke


Cotidianamente nos deparamos com slogans que exaltam a miscigenação racial. Há mais ou menos um mês, ouvi um pesquisador, titular de uma grande Instituição Científica, afirmar que: “Quanto mais mistura melhor. Por isso o brasileiro é forte. Nem 100% branco, nem 100% negro, mas 100% vira-lata.”

A princípio, não fiquei tão indignada com tal afirmativa, pois meus ouvidos já funcionam como “peneiras” para estas propostas maliciosas e destruidoras, principalmente porque no local as pessoas pretas eram nitidamente contadas. Mas, ao ler um Best-seller escrito por Corinne Hofmann, “A MASSAI BRANCA – MEU CASO DE AMOR COM GUERREIRO AFRICANO” e assistir ao filme tive a certeza que o sinônimo de Demônio para os povos brancos, foi palavra extremamente bondosa e caridosa do Profeta Malcolm X. Pergunto-me: Como é possível um guerreiro de um grupo africano tão resistente, os Samburu, sujar e prostituir o seu corpo e sua comunidade com uma MULHER BRANCA? Por que a comunidade Samburu aceitou este ser estranho em seu meio? Durante o filme é bastante visível os conflitos culturais e raciais que uma relação dessa espécie pode trazer sendo os relatos escritos em seu livro mais deprimentes e repugnantes.


TRAILER DE A MASSAI BRANCA


O povo Samburu é originário de Nubia-Kush e se estabeleceram ao norte do Monte Quênia e ao sul do Lago Turkana, na área do Vale do Rift, desde o século XV. Possuem uma existência de semi-nomadismo e a sua economia é baseada no pastoreio - na criação de gado, ovelhas, cabras e camelos - que representa riqueza e status. O povo Samburu celebra os nascimentos, os rituais de iniciação e casamentos com muita pompa e cerimônia. O apogeu da vida de um Samburu é o ritual iniciático à vida adulta.

Os casamentos são estruturados por uniões poligâmicas, onde um homem pode casar-se com tantas esposas que for capaz de pagar o dote. Quanto mais animais possuir, mais fácil será obter uma esposa. O dote para a família da noiva é tipicamente pago com gado. Os casamentos intra-clãs são proibidos e os casais escolhidos pelas famílias.

Falam a língua Maa, e são primos dos Massai, sendo normalmente confundidos. Os Samburu possuem uma história de resistência singular, não aceitando as imposições culturais do colonizador inglês, apesar das missões católicas e protestantes estarem presentes em suas terras, para destruir a sua cultura e dominá-los mentalmente.

Glory Outreach in Samburu


Uma das vitórias do povo samburu é manter a língua Maa e preservar as tradições dos seus ancestrais, apesar de que muitos guerreiros tiveram de participar nas tropas inglesas na 2ª Guerra Mundial e outros trabalham nas forças policiais do Quênia.

SAMBURU DANCE Vol.1


O filme de Hermine Huntgeburth deveria ser THE WHITE SAMBURU, isto é, se a mesma não desestruturasse a comunidade. O marketing europeu divulga os massai, por serem mais conhecidos, abertos ao contato com os brancos e muitos falarem o idioma inglês. O filme conta de forma deturpado o que está escrito no livro, a dita paixão sentida pela protagonista do filme por um Guerreiro Samburu, não passava de promiscuidade comumente sentida por brancos pelo nosso povo. A masculinidade do homem preto africano e diasporico desperta além de fantasias sexuais a representação de virilidade e um troféu. O envolvimento deles leva ao rompimento de praticas ancestral, como o não beijo na boca, para os samburu a boca é feita para alimentação e não com fins eróticos. A comunidade altera sua vivência e rotina com a introdução de objetos, costumes e alimentos europeus. É fortalecido o etilismo e uso de ervas de maneira depravada, sendo essas ervas usada de maneira sacerdotal e curativa por grupos religiosos de forma equilibrada, e não como objeto de alienação, fuga da realidade. Corinne Hofmann uma viciada na maconha alimentou tráfico de drogas no Quênia, como a mesma relata no seu livro na página 361:
“De acordo com o seu ponto de vista, Edy naturalmente vem por causa de mim e certo dia ele me pega comprando maconha de Edy. Ele ralha comigo como seu fosse uma fora-da-lei perigosa e ameaça me denunciar a polícia. Fico parada, perplexa, e nem seque consigo chorar. Afinal preciso dessa coisa para poder agüentá-lo. Tenho de lhe prometer que nunca mais fumarei maconha, senão ele me denunciará”.

Observa-se o quanto foi, é e será perigoso o envolvimento racial entre pessoas brancas e pretas, pois sempre a comunidade africana estará prejudicada. Como foi escrito no titulo do livro e do Filme: MEU CASO DE AMOR COM GUERREIRO AFRICANO, amor este destruidor, violento e egoísta. Realmente foi um caso, um momento na vida da mulher branca que volta para seu país de origem e lá continua sua vida sem maiores problemas ou alterações, mas para aquele homem preto que quebrou laços ancestrais, que negou sua forma de olhar o mundo e de se relacionar com ele foi simplesmente um iniciar de uma história catastrófica e irreparável, que não terá um fim tão breve, pois diferente dos brancos e seus atos egocêntricos, nós pretos compartilhamos com a nossa comunidade tudo a nos ofertado. Um provérbio africano diz assim: “A ruína de uma nação começa nas casas de seu povo”.

O Guerreiro Samburu Lektinga iniciou a destruição de seu povo no momento que olhou para aquela mulher branca de espírito prostituto e demoníaco e a deu valor de uma mulher. Não é possível amar alguém que bagunça nossa casa e nos leva a cometer delitos brutais contra si mesmo e aos seus. Manter laços afetivos com o estranho é suicídio e genocídio. O maior problema neste tipo de relacionamento é o fruto gerado, no caso deles uma filha chamada Napirai. Um ser mestiço é a peça mais perigosa dentro de uma comunidade, com certeza a crise existencial dessas pessoas, as torna uma arma de autodestruição, pois podem assumir a identidade do povo preto tanto quanto do povo branco e até mesmo formarem outro grupo pró mestiçagem. É relatado no livro que ao retornar da Suíça, Napirai chora ao olhar os rostos pretos da comunidade dos Samburu. O filme também não relata a sua carta de despedida na página 364, onde em um trecho ela escreveu:

"Mas, agora, depois da última chance que tivemos em Mombaça, reconheço que você não é feliz e eu muito menos. Nós ainda somos jovens e não poderemos continuar assim. Agora você não me entenderá, mas depois de algum tempo você também verá que vai poder ser feliz com outra. Para você é fácil achar uma nova mulher que viva no mesmo mundo. Mas dessa vez procure uma mulher samburu, não uma branca, somos diferente demais. Um dia você terá muitos filhos".

Corine tenta impor a sua cultura européia a um Guerreiro Samburu e à sua comunidade, como sempre o europeu projeta suas concepções de superioridade e de conquistas. Ela é oriunda da Suiça-Alemã. Os alemães, nesse período da história recente, construíram um legado de destruição e genocídio no continente africano. Nunca podemos esquecer o massacre dos Hereros e Nama, na Namíbia em 1905.

Clique aqui e leia mais sobre O GENOCÍDIO ESQUECIDO – A REVOLTA DOS HEREROS E NAMA NA NAMÍBIA


Assista ao filme e leia o livro que estão disponíveis em diversos sites. Veja com os seus próprios olhos e reflita sobre os fatos que acabei de relatar.


Informações Técnicas
Título no Brasil: A Massai Branca
Título Original: Die Weisse Massai
País de Origem: Alemanha
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 132 minutos
Ano de Lançamento: 2005
Estreou no Brasil: 21/09/2007
Site Oficial: http://www.dieweissemassai.film.de
Estúdio/Distrib.: Europa Filmes
Direção: Hermine Huntgeburth

PRETAS POESIAS

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Poemas de amor ao povo preto: https://www.facebook.com/PretasPoesias