Por Walter Passos - Historiador
E-mail: walterpassos21@yahoo.com.br
- Sua Derrubada!
Respondeu quase afônica Da. Bárbara na discussão com a sua
vizinha Elvira.
- É sempre assim!
Quem reside em gueto é obrigado a ouvir os barracos que acontecem e o melhor é ficar calado sem emitir opinião. As brigas ocorriam sempre
na Rua da Paz.
As causas eram diversas: cachorro, gato, fofoca, radiola
alta, dichotes e principalmente crianças.
O motivo dessa vez, como de costume, era por causa dos
filhos. Da. Elvira estava aborrecida
porque os “meninos de ouro”, os mabaços, de Da. Bárbara, não eram de
brincadeiras, viviam a mil por hora. Ninguém sabe o porquê das cargas de água
deram língua para a mãe de Da. Elvira, uma senhora setuagenária e cega. A filha
viu e não aliviou, já queria um motivo para ofender as crianças objetivando
atingir a vizinha.
Da. Elvira os chamou de filhos da.... Pronto! O estopim foi
acesso. Como vocês sabem Da. Barbara não “comia reggae” e a vizinha era
conhecida como Elvira “Bafafá”.
O fato importante é que nessas discussões de vizinhas os
podres são revelados. As duas foram amicíssimas na época de meninas. Estudaram
na mesma escola e sentavam juntas na sala de aulas, pareciam irmãs gêmeas. Prometeram serem comadres quando
crescessem....
Não saiam da casa da outra. Uma amizade inquebrantável. Até
que um dia, já mocinhas, Bárbara toda feliz apresentou a sua melhor amiga,
Elvira, o seu namorado: “Tonhão das Pretas” também epitetado como “Tonhão Lancaster”.
Porque se banhava com esse perfume e constantemente a amiga a acompanhava nos
passeios.
Elvira sempre dizia que não ligava de segurar vela, porque a
sua amiga era mais que uma irmã.
Em um sábado, Tonhão não foi à casa de Bárbara. Ela já
desconfiada que ele estivesse armando passou na casa de Elvira para pedir a sua
companhia, sendo informada que ela tinha ido à casa de uma prima e logo
retornaria. Não querendo esperar foi procurá-lo e dar o flagra. E deu. O encontrou
agarrado e beijando a sua melhor amiga Elvira e foi aquele bafafá.
Tonhão acabou casando com Elvira.
Até hoje, Da. Barbara
não perdoava a “traição” da ex-amiga e o “descaramento” de Tonhão.
Esses segredos vieram à tona na discussão e outros que
haviam sido jurados de dedos cruzados. Não olharam os dedos uma das outras.
O que sobra de uma amizade desfeita são os segredos!
Adjetivos foram proferidos e não devem ser relatados nesse
conto em respeito às senhoras ledoras.
Na verdade, não se interessam por furdúncios de ex-amigas. Mas, a coisa
foi de “careca ficar com os cabelos arrepiados”. E muitas mães esconderam os
filhos e ligaram os rádios para as crianças não aprenderem as palavras de
baixo-calão proferidas.
Para exemplificar, Da. Bárbara chamou Da. Elvira de
Badogueira, a qual respondeu.
- Sua boca de Chupar ovo!
Eta! Vamos parar por aqui. Em respeito às ledoras do conto.
Constantemente prestavam queixas na delegacia. Não dava em
nada. Já eram conhecidas do delegado, que as aconselhavam a viver em paz. Elas
nunca saíram na mão grande. Apenas dichotes eram falados quando alguma passava
na porta da outra e os cafofos eram paredes em meia.
Nesse ínterim, “Tonhão das Pretas” ficava escondido com
receio de seus segredos também serem revelados por Da. Bárbara o que
acarretaria brigas com a sua esposa.
Matreiramente ele foi pedir ajuda ao Seu Florisvaldo: O
bíblia, o crente. Presidente da Associação dos Moradores e que agia como um
“Juiz de Paz da Rua”, e com regularidade admoestava os moradores pregando a paz
e a harmonia.
Seu Florisvaldo e Tonhão das Pretas foram camaradas de
sambas e festas e dizem as más línguas que ele ajudou a armar o amigo com
Elvira Bafafá. Ah! Se Da. Bárbara soubesse desse esquema...
Após a confusão Da. Bárbara foi à cachanga de seu
Florisvaldo contar o ocorrido.
Argumentou:
- Tenho muita consideração pelo senhor! Sou sua eleitora e
exijo que expulse o safado do Tonhão e aquela mulherzinha dele da Associação
dos Moradores, porque são péssimos exemplos, além do mais, os filhos dela são
uns capetinhas em forma de gente, bem diferentes dos meus filhos que são uns
meninos de ouro.
Seu Florisvaldo sabia como lidar com essas questões, não era
a primeira e nem seria a última que uma das duas vizinhas o procuraria. Colocou panos quentes no “problema”.
Relembrou da amizade das duas, das famílias e explicou que
crianças desassuntadas possuem essas artes. Não era salutar duas senhoras mães
de família, elegantes e de respeito ficarem discutindo assim.
Argumentou carinhosamente:
- Da. Barbara a senhora é muito séria e como dizem os
antigos: a melhor resposta é aquela que não se dá.
Ele continuou:
- Minha avó me ensinou o seguinte: “quem muito se abaixa...”
a senhora sabe o que estou falando. Eu vou conversar com Tonhão e pedir que ele
convença Da. Elvira para acabar com isso.
E arrematou:
- Em consideração a minha pessoa, por favor, deixe isso para
lá. Sei que os meninos agiram errados e
ela deveria ter dado uma sova neles. Por isso que aqui em casa a madeira deita
sem compaixão. Errou! Pancada!
Da. Barbara ficou satisfeita com as “conversas” do seu
Florisvaldo, mas, exclamou:
- Ela me chamou de Nega Fedida! Imagine que ousadia!
Respondi: “negro é o seu passado sua desavergonhada!”
- Por que isso D. Barbara? Eu sou preto! A maioria dos
moradores da Rua da Paz também são. Acho que todos.
_ O senhor mesmo diz que África é local de maldição. Eu
quero ser negra nada!
- O senhor disse ou não disse?
Seu Florisvaldo ficou macambúzio e balançou a cabeça
confirmando. Explicou:
- Eu falei porque o pastor ensina na igreja.
É ou não é seu Florisvaldo?
Não. Da. Barbara. O pastor está errado!
Ela ficou atônita com a resposta e foi embora.
Pensativo no que disse e receoso de ser repreendido na
congregação religiosa, Seu Florisvaldo foi tocar o seu sousafone para
espairecer a cabeça.
Consciente que Da. Bárbara não era cofre para guardar
segredos e iria comentar a conversa com as vizinhas.
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